Vasco Falcão, director-geral da Konica Minolta Portugal e Espanha, acredita que quem aproveitar este momento para fazer a sua transição digital, não só vai garantir a sua sustentabilidade, como também vai diferenciar-se dos concorrentes. E lembra que o principal desafio do digital não é a tecnologia, mas sim a adaptação dos colaboradores a este “novo normal”.

 

Entrevista a Vasco Falcão, director-geral da Konica Minolta Portugal e Espanha

Que estratégia e objectivos tinha a Konica Minolta definido para 2020?

Desde 2008 que crescemos em Portugal e o objectivo para 2020 é manter essa rota. Além disso, e no plano conceptual, o que fazemos é ajudar os nossos clientes na sua transformação digital. Nesse sentido, a conjuntura actual de pandemia teve um efeito de acelerar a adopção dessa estratégia por parte dos clientes.

Quais eram os principais desafios que perspetivavam no pré-COVID?

Existia na economia portuguesa um ambiente muito favorável ao crescimento. Muita confiança, abertura para o investimento e para a cooperação. 

Neste contexto, havia dois temas que tínhamos elegido como críticos: a gestão do talento, pela escassez que começava a existir no mercado nacional, e a falta de urgência das empresas na adopção do digital como alavanca de crescimento. 

Como reviram e adaptaram a estratégia definida? 

Como em tudo na vida, podemos olhar para a pandemia como algo devastador e ficar de braços cruzados, ou podemos vê-la como uma oportunidade para superar novos desafios. 

Fizemos quatro adaptações: 

  • Mobilizámos uma equipa para temas críticos e imediatos e assim conseguir tomar decisões de forma ágil;
  • Elaborámos um plano adaptado de negócio e de tesouraria que continha quatro cenários, com o objectivo de assegurar a nossa sustentabilidade;
  • Garantimos de forma regular a comunicação com clientes, parceiros e colaboradores, explicando a todos, de forma transparente, a nossa estratégia e o que estávamos a fazer;
  • e adaptámos a nossa política de Vendas e de Marketing ao momento actual, através do lançamento de ofertas que fossem ao encontro das novas necessidades atípicas que esta pandemia colocou às pessoas e às empresas e às pessoas.

Quais são agora os principais desafios?

Eu diria que o principal desafio é a nova forma de comunicar e o impacto da COVID-19 no futuro do trabalho. Fazer entender a clientes, parceiros e colaboradores que a transformação não é instantânea e, como sempre temos dito, o principal desafio do digital não é a tecnologia, é a adaptação dos colaboradores a este novo normal. 

A biologia demora milhões de anos a evoluir, e muitas vezes queremos obrigar-nos a adoptar rapidamente formas de fazer, agir e pensar para as quais não fomos programados. 

Resumindo, o grande desafio será implementar os projectos de transformação digital nas empresas, sem esquecer as pessoas, que vão continuar a coexistir com a tecnologia. 

Sendo CEO não só para Portugal, mas também para Espanha, como geriu esta crise?

Em primeiro lugar, com muita proximidade e adaptabilidade. Apesar das limitações, continuei a viajar de Madrid para Lisboa com muita regularidade, porque há muitos momentos da gestão que são mais efectivos face-to-face. Mas também passei a utilizar muito as plataformas de vídeo conferência. 

Naquilo que foi a preparação, usámos a mesma metodologia, mas a execução foi diferente. Apesar da proximidade, não acredito que ‘one size fits all’. Pode haver muitas sinergias, mas também há bastantes diferenças. 

Além disso, os timings da crise e a reação das economias não foi igual. No caso de Espanha, já tínhamos anunciado mudanças organizativas em Novembro e o que fizemos foi manter esse plano. 

Em concreto no que respeita à Gestão de Pessoas, o que diria que foi/ está a ser mais desafiante?

Provavelmente o mais desafiante para mim está a ser o menor contacto directo com clientes, parceiros e colaboradores. Para a generalidade das pessoas, o grande desafio é gerir e manter as equipas motivadas remotamente.

Que prioridades definiu neste âmbito?

Faço a gestão de equipas remotamente desde 2013 e ainda me recordo das primeiras dificuldades que tive. Para que outros não passem pelo mesmo, defini a formação como elemento critico. Formação na utilização mais efectiva das ferramentas, na adopção equilibrada do remoto e no work-life balance.

Agora existe um hype e bastante atractividade pelas práticas de teletrabalho, e é muito bom que se aproveite o momento para introduzir estes conceitos, mas também é importante estar atento à forma como se implementa e dá a conhecer as boas práticas. 

 

O que não faziam e que vão passar a fazer, mesmo depois de passada a pandemia?

A formação interna que tinha uma grande componente presencial passará a ser muito mais digital. A Konica Minolta tem uma plataforma internacional de formação que em Portugal é pouco utilizada. Este momento permitiu perceber que muitos dos treinos ganham valor se passarmos a combinar os dois mundos.

Considera que os (para a maioria) novos modelos de trabalho exigem também novas competências aos profissionais? Quais?

Eu penso que a grande competência será a criatividade, no entanto estes novos modelos de organização do trabalho mais flexíveis favorecem as pessoas que têm mais ownership, que assumem a sua responsabilidade individual e que têm growth mindset.

 

E aos líderes, o que se exige de “novo”?

O momento actual só veio confirmar que a execução rápida, a adaptabilidade e a visão são competências core neste mundo cada vez mais ágil. 

Além destes aspectos, a capacidade de engagement com os outros também é fundamental, principalmente agora com os meios digitais.

Enquanto líder, e de forma genérica, o que é para si fundamental?

Ser feliz no trabalho e na vida, desafiar, partilhar e preocupar-me com os outros.

Se de facto houver uma mudança significativa nas formas e cultura de trabalho, quais serão os grandes desafios para as organizações? Por exemplo, como se mantém o engagement e a cultura organizacional?

Estamos sempre a adaptar o nosso modelo de comunicação e de acção a esta mudança, e o grande desafio passa por transportar uma experiência presencial para o digital. 

É bastante complexo fazer esta transição para aspectos intangíveis. Exige muito cuidado e detalhe. O formato dos eventos, a forma como a formação é realizada, tudo tem que ser pensado para dois mundos que são diferentes, mas que obrigatoriamente têm que proporcionar uma experiência única.

Pondera redefinir a vossa política de Gestão de Pessoas? Em que áreas em concreto se poderão registar mudanças mais significativas?

Algumas já foram alteradas, como por exemplo no recrutamento em Espanha. Em cada etapa o candidato recebe um vídeo a explicar qual é o próximo passo, ou mesmo com a apresentação da pessoa que vai conduzir a entrevista. 

Em Portugal, temos um programa interno que se chama KM Balance, que tem como objectivo promover o bem-estar dos colaboradores, que foi digitalizado para que quem estiver em teletrabalho possa usufruir das aulas de fitness ou de receitas online.

A Konica Minolta tem sido reconhecida como uma das melhores empresas para trabalhar em Portugal. O que acredita que tem justificado essa distinção?

Aspectos materiais como a qualidade das pessoas com quem podem trabalhar, a flexibilidade, os dias de férias, as oportunidades de crescimento profissional, a cultura japonesa e o acesso a tecnologia e formação.

Será que o que os profissionais valorizam vai mudar como consequência desta pandemia?

Penso que esta pandemia poderá reforçar a necessidade de worklife balance. Muitos profissionais descobriram que levaram para casa o que são nas empresas e, como tal, podem ser igualmente produtivos onde quer que trabalhem. Esse aspecto poderá mudar a relação que têm hoje com os horários e com as rotinas. 

Nota diferenças significativas, entre a realidade portuguesa e espanhola, nomeadamente em termos de atracção de talento, facilidade em encontrar de terminadas competências/ perfis ou formas de trabalho?

Existem diferenças muito ligeiras. No que diz respeito à atracção de talento, a Konica Minolta tem em ambos os países uma boa posição. Como estamos organizados da mesma forma, temos muitas sinergias.

Portugal vinha sendo muito escolhido por multinacionais para investir. A Konica Minolta é disso exemplo, tendo escolhido Portugal para instalar um centro de inovação. O que acredita que justificou essa escolha e esse investimento?

A confiança na gestão local, a capacidade de atrair talento, a nossa rede de clientes e não termos medo de errar.

O que devem as empresas e o País fazer para se manterem atrativos e competitivos?

Ter uma visão, adaptabilidade, executar rapidamente e ser humilde.

Que tendências perspetiva, não só para o mundo do trabalho, como para as organizações e para o País em geral?

Esta crise é única. Nunca aconteceu uma situação igual e não há registos históricos que nos permitam antecipar fórmulas que a resolvam. 

Actualmente, aquilo que me parece óbvio é que o break even point da maioria das empresas vai baixar. Neste contexto, muitos vão tratar de reduzir custos, deixar de investir e ser prudentes. Podemos entrar numa espiral negativa que em nada favorecerá o nosso futuro. 

Penso que quem aproveitar este momento para fazer a sua transição digital, não só vai garantir a sua sustentabilidade, como também vai diferenciar-se dos concorrentes que já estavam à frente nesta digitalização.

 

entrevista a
vasco falcao
vasco falcao

Vasco Falcão

director-geral da konica minolta portugal e espanha