A hora era a do lusco-fusco, onde as cores de lisboa parecem ser ainda mais brilhantes e não há filtros do instagram que as igualem. Enquanto em plena avenida taxistas ocupavam a faixa de rodagem, uma ante-estreia de uma peça concorria com a vernissage de uma marca de luxo da rua mais cara da capital.

Os que antes eram VIPs e que agora são influenciadores concorrem com as novas caras, utilizando as mesmas armas para demonstrar todo o seu potencial. Um telemóvel, um simples telemóvel mas que é posicionado no melhor ângulo, garantindo todos os compromissos comerciais. O local de trabalho de hoje é o Instagram, a rede dos millenials que parece estar a matar o facebook (embora sejam filhos do mesmo pai). InstaStories para que seja um momento, o imediato e o mural. A partilha feita de fotos, imagens a destacar roupas emprestadas com hastags que liguem a inspiração e o desejo a um ato de compra.

À porta do teatro bloguers documentavam a sua entrada, amontoando palavras para o derradeiro momento da partilha, sem aviso de publicidade ou separadores. Encontrando o product placement sem vírgulas ou filtros. Vale dizer asneiras, vale manter o tom ou até elevar, pode ser vídeo ou texto ou simplesmente uma fotografia. Tem é de ser partilhado, tem é de existir nesta nova realidade, neste mundo que parece agora mais real e com menos filtros do que o dia-a-dia, sem estar dependente de revisões dos gabinetes de comunicação e que vive de montagens, contratos, optimizações e algoritmos. Um mundo virtual que não é pior nem melhor, que se mistura e funde com o mundo real, que não é imaginário mas que cria histórias, que inspira e que impacta cada vez mais nas decisões de compra e nas imagens das marcas, seja porque a experiência brinca com os sentidos do ser humano, seja porque a tecnologia está de tal forma evoluída que o cérebro perde o discernimento de dividir o digital do real. Um mundo que de tão tecnológico que é passou a ser ainda mais humano. Porque como os humanos são difíceis de entender criamos máquinas e inteligência artificial para os prever, para os deliciar, para os compreender.

Num mundo desequilibrado entre a tecnologia e a realidade as marcas procuram a humanidade, querem destacar-se e ser cada vez mais pessoas. Ter sentimentos, provocar emoções, encontrar apaixonados mantendo os seus amantes. E se no passado este desejo era controlado, como quem desvia o olhar de um sorriso mais atrevido ou cora com o aguçar das palavras, as marcas hoje afirmam-se mais imperfeitas, para que possam ser verdadeiramente amadas. Porque a perfeição cansa e torna-se falsa, falsa demais para que seja para sempre e também porque o para sempre parece ser cada vez mais difícil de atingir.

Num mundo de marcas é cada vez mais difícil marcar, perceber se é a marca que marca ou a pessoa que é marcante na vida dos outros e que é decisiva na ligação à marca. No propósito da existência das marcas exige-se agora feitio, já não vale ser consensual, todos temos uma opinião e as marcas também. E essa opinião vai ser aceite, mesmo que discordante. Se a marca for verdadeiramente humana, humana na forma como promete e cumpre, humana na forma como trata os outros humanos e mais ainda como comunica, a marca vai ser marcante para as pessoas. Não apenas as imagens mas o tom de voz, o cuidado que tem nas suas associações, a frontalidade com que se assume não sendo promessas por cumprir mas não acreditando que o silêncio é em si uma posição de força. Uma marca que mesmo tímida fala, que mesmo extravagante tem os seus momentos de confidência que mesmo que pareça banal é única.

Influenciadores, decisores, comunicadores todos os dias dão corpo às marcas, construindo (ou destruindo) o seu propósito, a sua existência. Marcas que cada vez mais falam, marcas que deixam marcas porque ser humano é isso mesmo, é acreditar que temos um propósito para existir e que vamos marcar a nossa presença, mesmo que seja apenas no nosso pequeno mundo, na vida dos nossos pais, na vida dos nossos filhos.

 

Inês Veloso, global head of content & SEO da Randstad