Março de 2020: a transformação da perspectiva

O longo Março de 2020 será recordado como o momento em que a saúde pública obrigou o mundo moderno a parar. A luta constante pela vida e as incertezas sobre o futuro foram amplamente discutidas e repetiu-se inúmeras vezes a pergunta “Como será o amanhã?”. Apesar de melhor preparados, ainda existem muitas dúvidas e ainda estamos numa contínua adaptação. Uma coisa é certa, a pandemia acelerou a transformação! E não me refiro apenas à tecnologia, mas sobretudo à transformação de ideias, à quebra de preconceitos e à capacidade de reinvenção.

A necessidade de segurança fez-nos questionar as “verdades estabelecidas” e a criatividade aliou-se à urgência de fazer acontecer. De uma forma global, sentimos este fenómeno um pouco por todo o lado, mas sobretudo nos sectores do consumo, ensino e saúde: a Zipline, distribuidora de produtos médicos via drones, entre Junho e Setembro de 2020 entregou mais de 100 mil encomendas em regiões carenciadas, o mesmo que tinha entregue nos últimos 3 anos (e recentemente fez um acordo com a cadeia Walmart!); segundo o The Economist, o mercado do ensino digital vai crescer de 100$ biliões (2019) para 370$ biliões (2026), permitindo que chegue a mais pessoas; a criação de uma vacina, segundo o World Economic Forum, tem 5 estágios de desenvolvimento e pode ir até 10 anos. A vacina COVID-19 levou apenas um!

Impactos na economia e o “novo” papel dos bancos

A crise sanitária rapidamente gerou uma crise social e financeira. Para a controlar, foi necessário criar mecanismos de segurança económica-social para permitir algum equilíbrio financeiro nas pessoas, nas empresas e salvar o consumo da asfixia total. Neste contexto, os bancos, em conjunto com os reguladores e os governos, tiveram e terão que continuar a ter um papel determinante. Se na crise de 2008 os bancos foram encarados como a causa do problema, nesta crise é o oposto, pois são uma parte da  solução. Na implementação dos programas de apoio governamentais, os bancos rapidamente conseguiram adaptar os seus processos e sistemas para terem soluções digitais mais eficazes e com o mínimo de burocracia. É verdade que a maioria dos bancos já tinham iniciado os seus programas de transformação, mas este contexto acelerou-os, permitindo uma acção mais ágil e pragmática junto dos clientes.

Porém, o futuro prevê-se muito desafiador para a banca. Com esta crise, os bancos foram obrigados a aumentar significativamente as suas provisões devido às moratórias. Falando de Portugal, ⅓ dos financiamentos às empresas estão em moratórias (in Cor do Dinheiro) e a Roland Berger aponta para que o crédito malparado possa aumentar até 21 mil milhões de euros, colocando sérios desafios à capitalização. A estratégia de redução de custos, à qual a Banca foi obrigada, terá que continuar rigorosa (por exemplo, prevê-se uma nova redução de 1500 balcões). No outro prato da balança, a angariação de novas fontes de receita passou a ser igualmente urgente. Apesar de já muito ter sido feito, a transformação do sector ainda não está concluída e precisa de um novo folêgo.

Novos modelos de negócio: digitalização e flexibilidade

A digitalização da Banca não é recente, mas neste contexto de novos desafios passou a ser determinante, pois a própria pandemia fez também evoluir o consumidor digital, que ficou mais conhecedor, mais multiproduto e mais confiante nos pagamentos electrónicos. Segundo o relatório da SIBS sobre Portugal (2021), as compras digitais dos setores alimentar & retalho e deporto & recreativo cresceram mais de 100% em ambos os confinamentos. Os pagamentos digitais, nomeadamente com o MB WAY no telemóvel, cresceram 2 a 4 vezes mais que no período homólogo. Agora mais do que nunca, o consumidor também espera dos bancos um serviço mais rápido, mais desburocratizado e mais omnicanal, onde a interação física será apenas para situações complexas e estritamente necessárias.

Para a realização desta nova jornada de cliente, o contact center ganhará mais relevo nas organizações dos bancos. A actividade de contact center, pelos vários anos de experiência no mercado, conta com uma grande maturidade na área do customer experience e sempre a par das mais recentes tecnologias. Apesar da distância, a multicanalidade do contact center permite manter a interação e a proximidade com os clientes, desde o onboarding, suporte informativo, transacional e até na venda dos seus produtos. A robotização será cada vez mais comum na realização de tarefas triviais, libertando assim o esforço humano para as tarefas complexas e que criem mais valor para o cliente. Os dados dos clientes serão usados sistematicamente para uma maior personalização de ofertas, de serviços a prestar e na própria relação de confiança com o consumidor. Para isso, novas plataformas de CRM terão de ser desenvolvidas, comunicando com toda a rede do banco.

Não há como voltar atrás. No ”novo normal” dos bancos o risco será uma constante e por isso é necessário investir em modelos operacionais que garantam custos mais flexíveis, permitindo libertar mais valor para a modernização. E o actual contexto também pode ser a oportunidade para romper com o “sempre foi assim”. 

 

escrito por
ricardo monteiro
ricardo monteiro

Ricardo Monteiro

business unit manager, outsourcing, randstad portugal