Aquele que foi identificado como o maior desafio para 2020 em Janeiro, surge agora em quinto lugar e a perspectiva sobre o emprego sofreu uma mudança radical. Também se evidencia a urgência de reformular a lei laboral.

No início do ano, o destaque do Barómetro Human Resources foi para as tendências e grandes desafios das empresas, em concreto na área da Gestão de Pessoas. Como entretanto a pandemia COVID-19 virou a vida das empresas “do avesso”, o tema foi recuperado e os resultados comparados. Não surpreendentemente, mudaram substancialmente. Também foram recuperadas duas perguntas feitas ao painel de cerca de 200 especialistas há apenas dois meses, no “rescaldo” do confinamento obrigatório, e mesmo aí também se conseguem identificar diferenças. E (re)surgiram outros temas, como a necessidade de adaptação da lei laboral. São estes os principais resultados.

À pergunta “Quais serão os grandes temas da Gestão de Pessoas para 2020”, em Janeiro a resposta que surgiu destacada, por 59% dos inquiridos, foi a “atracção e retenção de talento”. Agora, surge em quinto lugar, sendo referido por apenas 16% das respostas (de lembrar que os inquiridos podiam escolher duas opções), ou seja, menos 43 pontos percentuais (pp) do que há apenas cinco meses. Em evidência surge agora a necessidade de “mudar as formas de trabalho” (57%), seguida pelo imperativo de “transformação digital” (29%) e pelo “equilíbrio entre a vida pessoal e profissional/ bem-estar dos colaboradores”, ex-aequo na terceira posição com “liderança de equipas” (20%). 

A transformação digital – subiu do terceiro para o segundo lugar, mas a percentagem de respostas a descer 13% pp (de 42% para 29%) – e o equilíbrio e bem-estar – que desceu da segunda para a terceira posição, baixando a percentagem de respostas em 20 pp (de 44% para 20%) – foram também as duas opções no pódio no início do ano, mas, como se verifica, com percentagens bem diferentes. 

De referir ainda que a “reestuturação de equipas” surge logo de seguida, com 18% das respostas. E temas outrora tidos como relevantes, como o Employer Branding (com 20% das respostas em Janeiro) e a Gestão Multigeracional (17%), surgem agora sem nenhum especialista a referi-los. 

Também bastante significativa é a diferença na perspectiva sobre a evolução do emprego em Portugal até fim de 2020. Se, em Janeiro, a maioria dos inquiridos (48%) acreditava que ia aumentar de 0,1% a 3%, agora a convicção é a aposta, com 59% do especialistas a antever que vai diminuir mais de 3%, opção que há cinco meses ficou com 0%, ou seja, era um cenário em que ninguém antevia. Se juntarmos aqueles que perspectivam uma diminuição entre 0,1% e 3% (37%), ficamos com 96% das respostas (mais 90 pontos percentuais do que no primeiro Barómetros deste ano. Agora ninguém acredita que os níveis de emprego irão manter-se até final do ano (em Janeiro reuniu 42% das respostas) e apenas 4% afirma que vai aumentar (2% entre 0,1% e 3%; e 2% acha que vai aumentar mais de 3%). 

Em relação às perguntas recuperadas do Barómetro realizado em Abril e publicado em Maio, a tendência mantém-se em relação ao impacto que a pandemia está a ter em termos de activos humanos nas respectivas empresas, com a maioria (35%) a afirmar que não vai recrutar as pessoas que tinham previsto. Já 25% admite que vai ser preciso despedir pessoas. A ordem das opções mais escolhidas não se altera.

O mesmo se verifica em relação à pergunta “Por quanto tempo antecipa que se manifestarão os impactos da COVID-19 na sua empresa”, com a maioria (29%, apenas mais um pp do que há dois meses) a acreditar que se farão sentir até um ano. Agora ninguém antecipa que em menos de três meses o impacto deixe de se fazer sentir, mas em Abril havia 4% com essa convicção. Por outro lado, 20% afirma que “nunca mais será a mesma coisa”, mais 6 pp do que há dois meses (14%). 

Porque os efeitos da pandemia já se fazem sentir nos números dos empregos, também se questionou o painel sobre se “reduzir o tempo de trabalho (para quatro dias ou menos, com a respectiva redução de salário) pode ser uma forma de mitigar os despedimentos”. As opiniões surgem muito divididas, com 45% a afirmar que não e com 43 a acreditar que sim. 

A Gestão de Pessoas

Sobre o papel que está a assumir a Gestão de Pessoas durante esta crise, nas empresas dos especialistas (podendo escolher-se duas opções), parece não haver dúvidas de que tem sido um papel relevante e estratégico. A maioria dos inquiridos (61%) afirmou que o/a gestor/a de pessoas tem tido um papel de “parceiro da gestão de topo, na gestão da crise a na criação se soluções”; e 49% garante que foi um papel “proactivo, liderando os processos de gestão da crise”. Já “assegurar a proximidade e acompanhamento dos colaboradores (gestão emocional) surge em terceiro, com 35% das respostas. De notar que só uma minoria referiu terem sido uma área “reactiva” (4%) ou meramente “administrativa” (4%). 

Um dos temas mais prementes actualmente nas empresas tem a ver com o regresso (ou não) dos colaboradores ao escritório. Quando questionados sobre se “os colaboradores estão a oferecer resistência ao regresso”, a tendência é evidente: não. A maioria (49%) constata que a resistência é “baixa” (31%) ou muito baixa (18%), com 14% a considerar que é inexistente, resultando numa percentagem acumulada de 63%.

Ainda neste âmbito, agora do lado dos empregadores, conclui-se que a opção da maioria (43%), a política estabelecida para o regresso dos colaboradores ao escritório, está a ser apostar num regresso “obrigatório, com uma percentagem máxima de ocupação até 50%”. Para 27%, a escolha foi deixar ao critério dos colaboradores deixarem ou não o teletrabalho, tendo sido poucos (6%) os que exigiram o regresso a “todos os que não estejam nas excepções definidas por lei”.  

A lei laboral

Sendo que, no contexto actual, quase semanalmente se estão a produziram leis excepcionais, para dar resposta à realidade e às necessidades trazidas pela COVID-19, questionou-se o painel de especialistas se “a lei laboral precisa ser reformulada”. Apesar de a maioria (53%) defender que “sim, mas só em determinadas áreas”, apenas 8% afirma que “não, as medidas excepcionais adoptadas foram suficientes e a lei deve manter-se”. Daqui resulta que 37% acredita que a lei do trabalho deve ser “profundamente” reformulada.

Sobre “quais os aspectos mais relevantes da lei laboral que devem ser revistos” surgem dois temas destacados em ex-aequo (com 49% cada): “flexibilidade na gestão de tempos de trabalho” e “regularizar (ou actualizar a redulação) diferentes regimes de trabalho”, como o teletrabalho, por exemplo. Segue-se a “flexibilização dos modelos de contratação” (39%) e a “reestruturação de empresa/ renovação de quadros/ despedimentos” (22%). Deduz-se portanto que flexibilização é a palavra de ordem, de acordo com os especialistas.