Porque há falta de mão de obra em Portugal: quais profissões e setores são os mais afetados

As empresas de todo o mundo têm de enfrentar um desafio persistente: a atual escassez de talento a nível mundial. De facto, dois terços dos líderes globais sentiram falta de talento os últimos 12 meses.

E com o surgimento de tecnologias revolucionárias como a IA generativa no mercado trabalho, encontrar pessoas com as competências certas para o futuro é mais difícil do que nunca, exacerbando a escassez de trabalhadores qualificados.

Este défice de talentos é já um problema grave para alguns países, e muitos fatores comuns a todas as economias estão a exacerbar a escassez, bem como fatores únicos, sublinhando a necessidade de encontrar soluções, como mostra o nosso último relatório sobre Compreender a Escassez de Talentos.

Nos últimos anos, a falta de talento deixou de ser apenas uma tendência global para se tornar uma realidade diária também em Portugal. Em 2025, uma grande parte das empresas portuguesas sente dificuldade em encontrar os perfis certos, sobretudo em áreas como tecnologia, marketing, vendas e funções altamente especializadas, devido à escassez de mão-de-obra.

Escassez de Talento em 2025: Uma Perspectiva Global

A escassez de talento continua a ser uma preocupação global em 2025, afetando diversos mercados de trabalho, como estudos recentes têm demonstarado:

• Estados Unidos: em julho de 2025, o número de vagas de emprego era de 7,2 milhões, enquanto o número de desempregados era de 7,4 milhões, indicando que o número de vagas abertas estava abaixo do número de pessoas desempregadas pela primeira vez desde abril de 2021.
   
• Europa: no final de 2023, empregadores na Europa enfrentavam dificuldades para preencher cerca de 1 milhão de postos de trabalho em aberto.
   
• Austrália: em agosto de 2025, o número total de vagas de emprego era de 327.200, representando uma diminuição de 2,7% em relação a maio de 2025.
   
• Singapura: em dezembro de 2023, havia 174 vagas de emprego para cada 100 candidatos disponíveis.

Esses dados destacam a persistente escassez de talento em várias regiões, refletindo desafios contínuos para empregadores e profissionais em 2025.
quais são causas da escassez de mão de obra?

A escassez de mão de obra em Portugal em 2025

Em 2025, Portugal enfrenta um desafio crescente: a escassez de mão de obra qualificada. Este fenómeno impacta diversos setores da economia, desde a construção civil até a tecnologia, e exige ações estratégicas por parte das empresas e do governo.

Dados recentes indicam que a escassez de mão de obra qualificada afeta significativamente o setor da construção civil em Portugal. Segundo a Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN), 86% das empresas de obras privadas e 75% das de obras públicas apontam a falta de trabalhadores qualificados como o principal constrangimento para o desenvolvimento de projetos.

Além disso, o Instituto Nacional de Estatística (INE) revelou que o número de vagas abertas no setor da construção aumentou 38% no primeiro semestre de 2025, evidenciando a crescente procura por profissionais especializados.~

Setores mais afetados
 

• Construção Civil: a falta de operários qualificados tem atrasado projetos e elevado custos. Empresas enfrentam dificuldades em contratar pedreiros, carpinteiros e eletricistas, essenciais para a execução de obras.
   
• Tecnologia da Informação: a crescente digitalização exige profissionais em áreas como inteligência artificial, cibersegurança e desenvolvimento de software. A escassez desses especialistas tem levado empresas a oferecer salários elevados para atrair talentos.
   
• Turismo e Hotelaria: com o aumento do turismo, há uma procura crescente por profissionais em setores como recepção, limpeza e restauração. A falta de mão de obra tem impactado a qualidade dos serviços prestados.

Quais são os sectores mais afetados pela escassez de talento?

Embora o impacto da atual escassez de talento varie consoante o local e o setor, é sem dúvida um dos maiores desafios da história moderna. Para ultrapassar este desafio, é importante identificar as causas da atual escassez de profissionais

Eis alguns dos fatores que estão na origem desta escassez de talentos:

1. Diminuição do talento de base

A disponibilidade de talentos depende de duas coisas: o número de pessoas em idade ativa e a sua disponibilidade para trabalhar, medida como taxas de atividade. Mas a disponibilidade das pessoas para participar no mercado de trabalho difere de um local para outro.

Alguns países, como a Austrália, os Países Baixos, a Bélgica, o Japão, o Brasil e a Argentina, registaram taxas estáveis ao longo do tempo, o que sugere que os seus adultos em idade ativa têm um comportamento laboral estável.

Mas as taxas de atividade em França, no Canadá e em Espanha diminuíram na última década, uma vez que as pessoas estão cada vez menos dispostas a participar no mercado de trabalho. Este é um grande problema, especialmente na Europa, onde a população em idade ativa já está a diminuir, o que torna ainda mais difícil encontrar trabalhadores talentosos.

Mas está a surgir uma contra tendência em alguns destes mercados. Em países como o Japão e a Alemanha, algumas pessoas com mais de 65 anos estão a optar por continuar a trabalhar, o que está a ajudar a resolver a escassez de talentos em vários setores.

2. Os empregadores não satisfazem as expectativas dos talentos em matéria de flexibilidade

As conclusões do nosso Workmonitor 2025 indicam que: 

 

1. propósito e valores pessoais como prioridades

A motivação dos profissionais está cada vez mais alinhada com os seus valores pessoais. Cerca de um terço dos trabalhadores afirmam ter deixado um emprego devido a desacordos com as posições ou visões da liderança da organização. 

Além disso, pela primeira vez na história do Workmonitor, o equilíbrio entre vida profissional e pessoal superou o salário como principal fator motivacional para atrair novos talentos. Os profissionais estão mais focados em encontrar realização através de um propósito alinhado com as suas crenças e circunstâncias pessoais.

 

2. importância do sentido de comunidade no local de trabalho

A sensação de pertencimento no ambiente de trabalho é crucial para o desempenho dos colaboradores. 85% dos profissionais afirmam que têm um desempenho superior quando há um forte sentido de comunidade na equipa. Isso destaca a importância de cultivar um ambiente colaborativo e inclusivo nas organizações.

3. investimento em aprendizagem contínua, com ênfase na inteligência artificial

Quase dois em cada cinco profissionais confiam nos seus empregadores para investir e oferecer oportunidades de aprendizagem contínua, especialmente em áreas como inteligência artificial e tecnologia. A IA é vista como uma competência essencial para o futuro, e os trabalhadores estão cada vez mais interessados em adquirir conhecimentos nesta área.

 

4. flexibilidade e qualidade de vida como prioridades para os talentos

A flexibilidade no trabalho e a qualidade de vida são fatores determinantes para os profissionais. Cerca de 39% dos inquiridos consideram o trabalho remoto não negociável, e 37% considerariam deixar o emprego se fossem obrigados a passar mais tempo no escritório. Além disso, 41% dos profissionais consideram importante ter flexibilidade de horário, refletindo uma busca por equilíbrio entre vida profissional e pessoal.

3. Taxas de desemprego historicamente baixas em 2025

As taxas de desemprego nos países da OCDE continuam próximas de mínimos históricos, refletindo um mercado de trabalho robusto, embora com desafios específicos:

• Alemanha, Japão e Reino Unido apresentam desemprego muito baixo, próximo do pleno emprego.
   
• Estados Unidos e Canadá também mantêm taxas reduzidas, indicando forte procura por profissionais.
   
• Espanha e Itália enfrentam maior número de desempregados, mostrando disparidades regionais na oferta de trabalho.
   
• Em vários países, o equilíbrio entre vagas disponíveis e trabalhadores qualificados dificulta preencher posições abertas, evidenciando a escassez de mão de obra qualificada.

 

4. aumento das taxas de oferta de emprego em 2025

A oferta de emprego continua em níveis elevados em muitos países, refletindo a forte procura por profissionais em todos os setores:

• Após a pandemia, a taxa de vagas aumentou significativamente, especialmente em áreas que exigem competências técnicas ou emergentes, como inteligência artificial e tecnologias digitais.
• Em países como Bélgica, Países Baixos e Alemanha, a taxa de oferta de emprego supera os 4%, enquanto nos Estados Unidos chega perto de 7%, indicando grande dificuldade em preencher posições.
• Este elevado nível de vagas gera desafios para as empresas, afetando a eficiência operacional, a inovação e a geração de receitas.
• Nos últimos dois anos, o problema intensificou-se: em muitos países, a taxa de oferta de emprego é agora aproximadamente o dobro do que era antes da pandemia.

 

 5. Envelhecimento da população

Outro fator que tem impacto na atual escassez de talento é a população mundial em idade ativa. Há anos que os empregadores de muitos países se preocupam com a substituição do número recorde de talentos que se reformam. Por exemplo, só nos EUA, 10 000 pessoas por dia atingem o limiar dos 65 anos para se reformarem e prevê-se que esta taxa se mantenha até, pelo menos, 2029.

Prevê-se que a idade média da população mundial aumente nas próximas décadas. Estudos estimam que, em 2030, uma em cada seis pessoas no mundo terá 60 anos ou mais e, em 2050, este número duplicará.

Na próxima década, haverá mais pessoas a sair do mercado de trabalho do que a entrar e, a longo prazo, as taxas de natalidade continuarão a diminuir nos países desenvolvidos.  

Em 75 países, as taxas de fertilidade já se situam muito abaixo da taxa de substituição desejada de 2,1, de acordo com as estatísticas da ONU e do Banco Mundial, um problema que continuará a afetar os empregadores pelo menos durante as próximas décadas.

O Japão, a Itália e a Alemanha têm vindo a registar esta tendência desde o início dos anos 2000, o que está a contribuir para a estagnação do seu crescimento económico. Na Alemanha, a migração tem ajudado um pouco com o envelhecimento da força de trabalho, mas os dados mostram que a população continuará a diminuir no futuro. Mesmo países com grandes populações como o Brasil e a Índia enfrentarão, dentro de algumas décadas, uma escassez de talentos qualificados.

A Bélgica, a França, os Países Baixos, a Espanha, o Reino Unido e a Polónia estão todos à procura de formas de manter os talentos na casa dos 50 e 60 anos no mercado de trabalho, mas alguns países são mais bem sucedidos do que outros. Para saber como a sua organização pode beneficiar de uma força de trabalho diversificada em função da idade, leia o nosso artigo aqui.

 

6. défice de competências tecnológicas

A escassez de competências digitais continua a ser um dos maiores desafios para empresas em todo o mundo. A rápida integração de tecnologia avançada, inteligência artificial e automação exige profissionais capazes de operar e tirar proveito destas ferramentas.

• Aproximadamente 14% dos empregos atuais correm alto risco de automatização, enquanto 32% sofrerão alterações significativas nas funções e competências exigidas devido à automação.
• As áreas mais afetadas incluem ciência, tecnologia, gestão, economia e direito, mas os empregos não vão desaparecer; pelo contrário, há oportunidades de crescimento para quem se adaptar.
• Existe uma correlação positiva entre a adoção de IA e o aumento do emprego: profissionais que se requalificarem podem aproveitar novas funções e especializações emergentes.
• Os empregadores devem investir em requalificação e formação contínua, garantindo que todos os colaboradores tenham oportunidades justas de se adaptar às mudanças.

Em suma, o déficit de competências tecnológicas é um desafio, mas também uma oportunidade para empresas e profissionais se prepararem para o futuro do trabalho.

Quais são os setores mais afetados pela escassez de talento em 2025?

Embora quase todas as indústrias enfrentem algum nível de escassez de profissionais, alguns setores em Portugal e globalmente são particularmente impactados:

 

Fabrico e Indústria Transformadora

Antes da pandemia, já se previa uma falta significativa de profissionais na indústria transformadora. Em 2025, a escassez continua, embora mais fragmentada:

• Em Portugal, setores como metalomecânica, automóvel e agroalimentar têm dificuldade em encontrar técnicos qualificados.
• Globalmente, países como Alemanha, Itália e Polónia continuam a crescer neste setor, enquanto outras regiões ainda lidam com desafios de produção e recrutamento.

 

Cadeia de Abastecimento e Logística

O setor da logística mantém-se entre os que mais criam emprego, devido à forte procura:

• Em Portugal, a escassez de motoristas de transporte pesado, operadores logísticos e técnicos de armazém é evidente.

Internacionalmente, a falta de profissionais qualificados nas cadeias de abastecimento — incluindo condutores e operadores portuários — ainda gera atrasos e desafios operacionais.

 

Cuidados de Saúde

O setor da saúde continua sob pressão:

• O envelhecimento da população portuguesa aumenta a procura por médicos, enfermeiros e cuidadores especializados.
• Muitos profissionais abandonaram o setor devido ao esgotamento e ao stress durante e após a pandemia, aumentando a escassez de talentos.
• Em 2025, é esperado que o número de funções de saúde aumente significativamente, especialmente em geriatria e cuidados continuados, criando um desafio adicional para empregadores e políticas de formação.
   

Qual o impacto da escassez de talento?

A escassez de talento continua a afetar empresas e a sociedade em Portugal:

• Operações e serviços: A falta de profissionais qualificados tem causado atrasos na cadeia de abastecimento, escassez de produtos e, em alguns casos, redução de horários ou encerramento temporário de estabelecimentos.
• Custos e inflação: A elevada procura por profissionais pode pressionar salários e, consequentemente, os preços de produtos e serviços.
• Tecnologia e inovação: Muitas empresas não conseguem implementar novas tecnologias sem profissionais com competências adequadas, limitando a transformação digital.
• Desafios de longo prazo: A escassez sustentada exige estratégias de requalificação, atração de talento internacional e criação de centros de competências.

Apesar dos desafios, empregadores ágeis podem encontrar soluções: programas de migração qualificada, formação contínua e políticas de retenção ajudam a desbloquear novos grupos de talentos e a preparar o mercado para o futuro.

Mesmo assim, será necessário um esforço conjunto dos decisores políticos e dos líderes empresariais para mudar a direção. Discutimos os desafios e as potenciais soluções em pormenor no nosso relatório sobre a compreensão da escassez de talentos.

Esta é uma versão atualizada de um artigo originalmente publicado em 14 de outubro de 2022.