Em Portugal, a cultura de valorizar a estabilidade e a dedicação a uma empresa ainda tem o seu peso. Contudo, observa-se uma tensão crescente entre essa segurança aparente e a necessidade imperativa de progressão na carreira. A verdade é que, num mundo profissional em constante evolução, o que antes era visto como um porto seguro pode, silenciosamente, transformar-se numa âncora que impede o seu desenvolvimento.

Este artigo não pretende ser alarmista, mas sim um guia lúcido e prático. Mergulharemos nos meandros desta questão: identificar os subtis sinais de alerta de uma carreira estagnada, explorar os verdadeiros riscos de uma carreira longa na mesma empresa, e ponderar sobre  o melhor momento para mudar de trabalho(pode ser a decisão mais acertada para evitar perder oportunidades profissionais valiosas). Prepara-te para uma análise que te fará repensar o teu próximo passo profissional.

A "zona de conforto": quando a estabilidade se torna estagnação

 

É perfeitamente natural valorizar a estabilidade que um emprego de longa data pode oferecer. Quem não aprecia a sensação de segurança e o domínio das suas funções? Contudo, existe uma linha ténue que separa o conforto da complacência, e esta última, da temida estagnação.

Os lados positivos de permanecer na mesma empresa

 

  • domínio e especialização: anos de experiência na mesma organização transforma-te num especialista nos seus processos, cultura e até nos seus segredos mais bem guardados. Este conhecimento profundo é, sem dúvida, um ativo.
  • rede de contactos interna sólida: conhecer as pessoas certas, saber a quem recorrer e como fazer as coisas acontecer. Esta rede interna pode ser incrivelmente eficiente.
  • segurança e previsibilidade: a estabilidade financeira e a familiaridade com o ambiente de trabalho proporcionam uma tranquilidade que muitos procuram e valorizam.
  • reconhecimento e confiança: com o tempo, é natural que te tornes uma referência, um pilar em quem a equipa e a liderança confiam.
  • benefícios da antiguidade: em muitas empresas portuguesas, a longevidade é recompensada com dias de férias adicionais, melhores condições de seguro de saúde ou outros "miminhos" que sabem bem.

 

Esta familiaridade e segurança são, de facto, confortáveis. Mas aqui reside o busílis da questão: até que ponto esse conforto está a alimentar o teu crescimento ou, pelo contrário, a limitá-lo?



 

O perigo oculto: como o "estar bem" pode ser um sinal de alerta

A "zona de conforto" profissional é aquele espaço onde as tarefas são rotineiras, os desafios são previsíveis e a sensação de controlo é quase absoluta. Parece ótimo, certo? Em parte, sim. Mas, do ponto de vista do desenvolvimento profissional contínuo, esta zona pode ser traiçoeira.

Pensa nisto: quando foi a última vez que sentiste aquele friozinho na barriga perante um novo projeto verdadeiramente desafiador? Quando tiveste de aprender uma competência completamente nova para te manteres relevante?

 

  • a ilusão do controlo- dominar o que se faz é excelente, mas se não há novos estímulos, a tua curva de aprendizagem achata. Deixa de expandir as tuas competências ao ritmo que o mercado exige.
  • complacência disfarçada- a ausência de pressão para inovar ou para se superar pode levar a uma certa apatia. O "sempre se fez assim" começa a soar mais alto do que o "e se tentássemos de outra forma?".
  • menor adaptabilidade- ao estar resguardado num ambiente conhecido, a tua capacidade de adaptação a novas realidades, equipas ou metodologias pode diminuir, tornando uma eventual necessidade de mudar de emprego mais intimidante.


     

 

Este cenário é o terreno fértil para a estagnação profissional. Não acontece de um dia para o outro; é um processo gradual, quase impercetível, onde o crescimento fica em pausa, enquanto o mundo lá fora continua a girar a alta velocidade.

estagnação profissional
estagnação profissional

Como saber qual o momento certo para abraçar um novo projeto?

 

Então, como saber se a tua carreira está a pedir uma lufada de ar fresco ou, quiçá, uma mudança de rumo? Presta atenção aos seguintes indicadores – são mais comuns do que imaginas:

 

A chama da aprendizagem esbateu-se? 

Lembras-te da última vez que aprendeste algo genuinamente novo no trabalho? ou daquela sensação de entusiasmo ao dominar uma nova competência? se os teus dias são uma sucessão de tarefas repetitivas, sem desafios que te estimulem intelectualmente, o teu desenvolvimento profissional limitado pode ser um facto. a ausência de uma curva de aprendizagem ascendente é um forte indício de que algo não está bem.

 

Promoções e novos desafios? 

"Nem Vê-los!" A progressão na carreira não se mede apenas em aumentos salariais, mas também na conquista de novas responsabilidades, projetos mais complexos ou uma evolução na hierarquia. Se olhas para trás, e os últimos anos parecem uma fotocópia uns dos outros em termos de função e desafios, e se as oportunidades de crescimento interno parecem sistematicamente contornar-te, é um sinal claro de alerta.

 

 A desmotivação tornou-se a tua sombra? 

Aquela sensação de "segunda-feira negra" estende-se por toda a semana? A dificuldade em encontrar propósito ou entusiasmo nas tarefas diárias é um sintoma clássico. Quando o trabalho se resume a "cumprir calendário" e a paixão inicial se dissipou, a estagnação pode já estar instalada. Não confundas isto com um dia mau ocasional; falo de um sentimento persistente de apatia.

 

As tuas competências estão a apanhar pó? 

O mercado de trabalho em Portugal, tal como a nível global, é dinâmico. Novas tecnologias, metodologias e exigências surgem a um ritmo alucinante. Se sentes que as suas competências não evoluíram significativamente nos últimos anos, ou se olhas para as ofertas de emprego na tua área e percebes que lhe faltam requisitos atuais, estás a perder competitividade.

 

O comboio da evolução passa por ti... e pelos outros?

Observas colegas, especialmente aqueles que ousaram mudar de emprego, a alcançar novos patamares, a adquirir novas experiências e a expandir os seus horizontes, enquanto pareces estar parado no mesmo sítio? Esta comparação, embora por vezes desconfortável, pode ser um espelho importante da tua própria situação.

 

O teu salário reflete o teu valor atual? 

Se o teu salário tem tido apenas atualizações residuais, que mal acompanham a inflação, e te percebes que profissionais com o teu perfil e experiência, mas que mudaram de empresa, auferem valores significativamente superiores, este é um forte indicador económico da tua estagnação.

 

 

Reconhecimento? Feedback? O Que é Isso Mesmo? A ausência de feedback construtivo ou de reconhecimento pelo esforço e conquistas podem minar a tua motivação e fazer com que te sintas invisível. Um bom líder investe no desenvolvimento da sua equipa; a ausência disto pode ser um sinal de que a própria empresa não está a fomentar o teu crescimento.

bússola estragada
bússola estragada

Identificares-te com vários destes pontos não é motivo para pânico, mas sim para reflexão e ação. É o primeiro passo para questionar se não estará na altura de considerar quando mudar de trabalho  ou, pelo menos, de procurar ativamente formas de reacender a chama da progressão na carreira.

Assume o controlo da tua progressão na carreira

Chegados a este ponto, é provável que muitas reflexões tenham surgido. A questão de permanecer muito tempo no mesmo emprego e o potencial risco de estagnação para a tua carreira não é trivial; toca no cerne da nossa identidade profissional e das nossas aspirações futuras. O primeiro passo para a mudança é, precisamente, a consciencialização que procurámos estimular ao longo deste artigo.

 

A verdade, por vezes desconfortável mas fundamental, é que a progressão na carreira é, antes de mais, uma responsabilidade tua. Esperar que as oportunidades surjam por acaso ou que a empresa adivinhe as tuas ambições é, na maioria das vezes, uma receita para o desenvolvimento profissional limitado e para a frustração. 

Contudo, se te identificaste com os sinais de alerta ou com as potenciais consequências de  ficar no mesmo emprego, não o encares como uma sentença. Encara como um diagnóstico que te permite agora agir de forma informada. A estagnação profissional pode ser revertida com proatividade, seja através da procura de novos desafios internos, da aposta séria na requalificação e atualização de competências, ou, quando se justifica, da coragem para mudar de emprego e abraçar novas oportunidades profissionais.